Letters in Store

Wednesday, March 19, 2008

"Não me queiras mal por gostar de ti. Não me condenes por querer a tua pele na carne dos meus dedos e sentir o sangue pulsar de uma vida que julgara esquecida. Não te afastes de mim se o meu sopro te asfixia, pois asfixiado ando eu por querer só mais um minuto, um olhar, um novo tempo.

Vejo multidões passar diante dos meus olhos, páginas e páginas li e me trouxeram a este dia, e noite seria se não te visse agora, sorrindo, e tocando-me levar-me à loucura de elegias de outros tempos, tão felizes. Projectos faço, entrelaçando os nossos caminhos, e futuros fantasio, milhares deles, em que os dois seremos felizes, só porque existes.

Se não estás presente, não há santos, não há altares que mereçam ser erigidos. És o corpo que adoro, a alma que desejo, a voz que ecoa dentro de mim. Chama-me de entre as sombras, elege-me de entre milhares, partilha o que és comigo e eu ser-te-ei fiel. Fielmente adorado serei eu por ti. Estamos juntos, vem, acredita em nós.

As nuvens, contudo, são muitas e a minha mente fermenta tempestades. O teu silêncio é o abismo em que mergulho a cada noite e as trevas afundam a esperança, o sonho, a audácia de te dizer que quero-te para mim. Choro se estás comigo e esmago-me pela distância que existe entre os dois.

Quebra-se o peito de não estar contigo, se estás ausente pelos mais diversos motivos. Razões, essas, arranjo-as eu para sobressair de entre os outros, em vão, talvez, pela minha mortalidade, mas o que é isso senão a percepção de saber que se revelo o que sinto por ti ao mundo é a verdade de um fim que vem e que só por ti se adia.

Juntos faria eu loucuras, mas os loucos amam em demasia ou demasiadamente se perdem nas palavras que matam com a boca. Por isso não tas digo, escrevo-as, como um segredo que, espero, venhas a descobrir. Vive, pois, no teu palácio da mudez, do qual ninguém sai, nem a Ventura, minha aliada de outras demandas e de outros dias.

Vem, une a tua carne à minha, sejamos sangue e pó, amaldiçoemo-nos para sempre, alheios ao fim do mundo. Mundos criaremos no beijo da fantasia, aquela em que serei a água para a tua sede, a sombra dos dias de Verão, a carícia na pele de um sonho que perdura.

Fantasia, realiza, acredita em mim. Não partas, fica só mais esta vez, e de vez liberta-me do Inverno do inferno do dia-a-dia, pois que não sinto já nada, agora que te preparas para partir. Fica nesta linha, não avances mais, sustém o tempo...e transforma aquilo que sou no amante que querias."

(Silêncio)

Clara suspira ao acabar de ler aquele livro. Fecha-o e enrola o cachecol à volta do pescoço. Desfazendo-se no meio da multidão, partiu. E o livro, algures, ainda ecoa o seu nome na prateleira onde o guardara.

4 Comments:

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    By Blogger Catarina, at 9:26 AM  

  • Há alturas em que gostava de conseguir inventar palavras com a mesma facilidade com que as coloco - inventadas - na boca de personagens. Agora dar-me-ia jeito uma palavra dessas inventada, até porque "espectáculo" me parece muito simples para o que gostava de te dizer. Superaste-te! Supera-te no som das palavras realmente vozeadas também. Estou certa que serás capaz.

    By Blogger Catarina, at 9:28 AM  

  • Gostei. Não...... Amei!!!
    Quem ama e se dá assim merece a
    recompensa ambicionada.Quero acre-
    ditar que a alcançarás.

    By Anonymous Anonymous, at 5:09 AM  

  • para escrever assim é preciso ser amante das palavras, mas acima de tudo da vida. é preciso estar apaixonado para escreveres desta forma... tenho a certeza!

    By Blogger Liliana Ponces, at 2:32 AM  

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