F.P.

Meditava na vida que vibrante percorria os seus olhos. Era espectador deste teatro há tanto tempo que se esquecera do seu papel de protagonista. Limitava-se a assistir e registar o que via, criando, recriando, refazendo a realidade para a sua, pensando no papel que reclamaria a atenção dos outros actores, mas fingidor seria se pensasse que tomaria esse espaço no palco da vida.
Doía-lhe o pensar, afundava-se no vazio e na dor sabendo que observava aquele papel vazio, branco, neutro, livre. Desejou essa brancura, essa liberdade de ausência tantas vezes invejada nos outros - e como queria os outros em si - mas sucedia o silêncio do pensamento e lá escrevia uns rabiscos no seu Moleskine.
Levantou-se do banco da esplanada e colocou o chapéu. Pegou no bloco de notas e acendeu mais um cigarro. Deixara o copo de vinho vazio, como habitual. Mas o papel, esse, poupara-o pela candura da sua ausência de palavras, essa liberdade sentida, pensada e imaginada.
Despediu-se do Sr. Almeida, do café. Fernando sentir-se-ia de baptismo, não fosse a nostalgia. Pessoa julgar-se-ia um dia, quem sabe pensando o futuro...
E seguiu o caminho, rumo ao teatro...